A Organização Mundial de Saúde (OMS) define Saúde Mental como «um estado de bem-estar no qual o indivíduo realiza as suas capacidades, pode fazer face ao stress normal da vida, trabalhar de forma produtiva e frutífera e contribuir para a comunidade em que se insere», sendo, por outro lado, a doença mental considerada uma condição clínica associada a alterações na emoção, cognição, volição, pensamento, perceção e/ou comportamento, que cursam com sofrimento significativo e com comprometimento do funcionamento de uma ou mais áreas importantes da vida do indivíduo.
Segundo dados recentes da OMS, estima-se que cerca de um bilião de pessoas no Mundo sofre de algum tipo de perturbação psiquiátrica, sendo o estigma face à doença mental alvo de crescente atenção e debate nos últimos anos, dado o impacto negativo deste na vida e saúde dos indivíduos.
O Estigma
O Estigma é entendido como a construção negativa, real ou percebida, dirigida a um ou mais indivíduos da sociedade que são afetados por alguma condição ou característica, não necessariamente física ou visível, que não se coaduna com o quadro de expectativas sociais vigentes na sociedade em que o indivíduo se insere. Tem caráter pernicioso e complexo, permanecendo ainda bastante enraizado na sociedade atual, traduzido pelo facto de as doenças do foro mental serem, ainda, encaradas como secundárias, menos importantes, sendo frequentemente subestimadas e desvalorizadas.
A reduzida literacia em Saúde Mental da população em geral propicia a criação e perpetuação de muitos mitos, estereótipos e informações erradas, que promovem o preconceito, a discriminação e a estigmatização dos doentes com algum tipo de perturbação psiquiátrica.
Estereótipos associados à doença mental são frequentemente veiculados pela comunicação social, fazendo com que indivíduos com doença mental sejam tidos como perigosos, violentos, imprevisíveis, instáveis, criminosos, responsáveis pela sua doença, preguiçosos e vítimas dignas de pena, o que contribui para a manutenção do estigma, discriminação e segregação social destes doentes.
Consequências do Estigma
O estigma associado à doença mental acarreta inúmeras consequências nefastas, retardando e/ou impedindo a procura de cuidados de saúde, a instituição ou manutenção de tratamento e, consequentemente, a sua recuperação, reabilitação e reinserção social.
Das várias consequências do estigma destacam-se:
- Sofrimento psicológico: sentimentos de culpa, vergonha, vazio e menos-valia;
- Diminuição dos contactos sociais, isolamento e necessidade de secretismo relativamente ao diagnóstico por receio de ser rotulado como «diferente, maluco ou tolo»;
- Desigualdade social e de oportunidades;
- Dificuldade no acesso a serviços, emprego, integração social e na aquisição/manutenção de relações afetivas
- Comprometimento do tratamento da doença mental, resultado do atraso na procura de ajuda médica, diagnóstico e instituição de tratamento, bem como da diminuição da adesão terapêutica;
- Aumento dos pensamentos suicidas;
- Comprometimento da saúde geral (portadores de doença mental têm maior probabilidade de padecer de doença orgânica devido ao subdiagóstico e subtratamento destas condições neste grupo de indivíduos);
- Prejuízo da qualidade de vida dos doentes, das famílias e pessoas próximas.
Geralmente, o estigma envolve a pessoa que sofre da perturbação psiquiátrica, os seus familiares e pessoas próximas, a medicação e outras formas de tratamento, as instituições onde o tratamento é realizado e os profissionais de Saúde Mental. Segundo a Associação Mundial de Psiquiatria, o estigma cria um círculo vicioso de exclusão, isolamento e discriminação, constituindo uma enorme barreira no acesso aos cuidados de saúde e à qualidade de vida das pessoas com doença mental e dos seus familiares, por vezes até mais importante do que a própria doença (Figura 1).
Como combater o Estigma associada à Doença Mental?
O estigma face à doença mental é um fenómeno tão antigo quanto complexo, representando uma barreira à concretização de projetos pessoais e à integração social plena, enquanto objetivo principal da prática psiquiátrica atual. O seu impacto na vida dos doentes é indiscutível, comprometendo o acesso aos cuidados de saúde, com consequente aumento da morbilidade e mortalidade desta população vulnerável e diminuição franca da qualidade de vida.
A comunidade científica tem dedicado um esforço considerável à compreensão deste fenómeno e à delineação de estratégias anti-estigma, nunca descurando o local onde este efetivamente se desenvolve – na vida quotidiana. Combater o estigma é algo para o qual todos os profissionais de saúde devem estar sensibilizados, sendo a educação para a Saúde Mental da população geral a base da luta contra o estigma.
É, portanto, essencial que se desconstruam rótulos, preconceitos e estereótipos, que se combata a desinformação e que se criem campanhas de sensibilização e educação para a Saúde Mental, bem como legislação que vise reduzir a discriminação e o preconceito. Para além disso, é nos profissionais de saúde e nos governantes que reside o maior potencial de mudança e é deles que deve partir o exemplo para que, aos poucos, se combata o estigma associado às doenças mentais.
Para terminar, é importante sublinhar que o diagnóstico de doença mental não é uma sentença ou sinónimo de fracasso, que «ter uma doença mental» é diferente de «ser doente mental», que as pessoas transcendem as suas doenças e que o tratamento das perturbações mentais é possível, sendo tanto mais eficaz e efetivo quanto mais precocemente for instituído.
Não hesite em procurar de apoio de profissionais da área da Saúde Mental.
O prognóstico das doenças psiquiátricas, tal como das restantes, depende do diagnóstico e tratamento precoces.
Não adie a sua Saúde! Dispomos de uma equipa disponível para o ajudar!
Autora:
Dra. Patrícia Perestrelo Passos
Psiquiatria